VOU ACORDAR MAIS VELHA

Mais um ano de vida sobre o meu corpo.Toda eu envelheci, ainda que o tempo tenha sido generoso comigo. Mas envelheci. E não é aquela velha história de que todos envelhecemos. Envelheci pela força de muitas histórias que a vida somou em cinco décadas e mais de meia. Envelheci nos ossos que começam a dar os primeiros sintomas de desgaste, na pele que começa a perder a rigidez, no rosto que acusa algumas rugas. Envelheci e já é irreversível este envelhecimento de comando ou descomando hormonal. Não posso fazer nada. Envelheci.

Curiosamente, sinto não sei onde, ainda a acenar-me, uma alma de menina. Continuo a gostar de brincadeiras malucas , de sorrisos e de gargalhadas, de partidinhas, de surpresas, do sol infinito e das árvores altas( mesmo se as vejo de baixo), da areia do mar, das crianças( meu Deus, as crianças!!!) , do passado que guardo intacto no meu espaço mais íntimo.

Vou acordar um ano mais velha.Cinquenta e oito folhas de uma árvore outonal que receia perder a seiva ou ver fenecer o tronco. Tenho pena de envelhecer. Palavra que tenho pena, tanta pena!!

Mas hoje estou viva. E vou festejar a minha vida, enquanto sentir pulsar nas ondas do meu cérebro, uma jovialidade saudável, de memória preenchida.E porque a memória também é afago, é para os meus pais que vai o meu primeiro beijo e a minha saudade descarnada, numa frustração dolorosa- a de não vos poder abraçar ou de ouvir das vossas bocas a poesia que também nos vossos olhos se extasiava: "Parabéns, filha! Que Deus te abençoe!"

Obrigada, mãe, pelo teu corpo, que me abrigou como uma fortaleza, desde o primeiro sinal de mim em ti;obrigada pela herança de força e de determinação que me legaste; obrigada por me teres feito sempre acreditar que eu tinha coração de pomba; obrigada, pai, pela infância tão divertida em palcos sempre improvisados de canto e dança e teatro e palhaçadas inesgotáveis. De ti, herdei o gosto de surpreender a vida e de a preencher de inovação. Para o meu marido, minha cara metade, cheia de bondade e de paciência, a gratidão por isso , mas, sobretudo, pelo esmero com que se empenhou em dar-me uma estrela sonhadora que veio iluminar, ainda mais, a minha vida.

Para ti, filha, o meu obrigada por estares sempre a tomar conta de mim, desde que te apercebeste que eu era uma criança ou que o meu mundo era o da lua, para onde te ensinei a olhar, desde pequenina; obrigada, por me teres dado a beber tranquilidade, de seres, toda tu, uma sinfonia de acordes doces e luminosos; obrigada pelo teu sorriso que preenche os espaços onde o esvoaças.

Mas há ainda os amigos e os filhos de amigos, a quem dediquei tantas horas de graça, muitas vezes em cima das dunas, embalados pelos acordes do mar, numa paisagem de hálito marítimo que gosto de evocar; há ainda o «Zé Pedro e a Matilde, meus primeiros netos», que eu não dispenso, e que me espicaçam a vontade de ser sempre a tia «maluca»...

Depois há ainda os amigos que conheci na net e antes da net e que vêm cá deixar dicas, dardos, destinos longínquos, ilhas encantadas, luares de janeiro, sussurros de mar, todos de bem, todos de harmonia, mercês que Deus me deu. Outros abrem-me as portas dos deuses, verdadeiro espólio de beleza e de sabedoria.
E depois há os alunos, alguns, que também vêm quando podem, acenar-me de várias partes de Portugal e de algumas do mundo, aqueles a quem a «chata» obrigou a articular e a não mastigar as sílabas da "língua, que também é a sua pátria", e que, graças a ela, e aos que a amaram, encontra força espiritual para sorrir, ainda que se façam rio as lágrimas de Minerva.



Comentários

Delfim Peixoto disse…
Parabéns!!! Muitos, muitos beijos e "resmas" de Felicidade. O corpo envelhece, sim, mas a Alma, não!
Beijinhos doces!
Anónimo disse…
Parabéns, setora, e que continue a ser a se sempre a"chata" que me ensinou a gostar de ler.
Muitos parabéns e felicidades!
Anónimo disse…
Lia/Ibel/ ou qualquer outro hipocorístico nome que assines, enfim, Isabel, que é nome próprio e apropriado e cantante!
Li a princípio entusiasmada, para logo ficar emocionada. Li alto, para melhor ouvir a tua prosa poética e partilhar das tuas emoções.
Qualquer palavra é a mais. É de pouco. Dizes tudo, mimas todos e dás-te na gentileza duma energia que condiz com a tua vivência de merecida princesa.
Os anos contam. Tu contas.
É verdade, e ainda bem.
Cuida de ti, porque é a melhor maneira de iluminares à tua volta. Tu mereces essa auréola, nós merecemos recebê-la
Boas luzes, princesa para este ano, e que o dia te traga muitas flores. E gostos.
Obrigada por me aconchegares com a tua amizade. Muitos parabéns e um abraço de ventos ilhéus.
Tua recente amiga, Mercês
Anónimo disse…
Como poderás acordar mais velha se em ti continua um coração de menina?São os anos que vão passando que te tornam assim pueril e traquina!São os anos passados que te fazem lutadora destemida!São os anos passados que te fazem generosa e grata nas horas certas!são os anos passados que te fazem filha apaixonada e saudosa!São os anos passados que te fazem mãe agradecida pela dádiva que geraste! São os anos passados que nos fazem rever a amizade construida!São os anos passados que fazem teus nossos netos amdos que esperam os teus!São os anos passados que te fazem Ibel,em distantes paragens admirada!são os anos passados que te fazem para mim Irmã partilhada!
São aos anos passados que eu agradeço ter-te por irmã amiga.Obrigada "anos passados" obrigada anos muitos esperados!
PARABÉNS
Cinda
Texto ao correr das teclas sem revisão Mas com verdade
Anónimo disse…
Professora,

Muitos parabéns.gosto muito muito de si e por isso não preciso de me identificar porque sabe muito bem quem sou.
Espero que possa ser minha professora até ao fim do 12º ano.
Mar de Bem disse…
LIA, "som de véu, vela e veludo"... foi assim que te conheci, princesa do reino da poesia, olhos enormes espreitando todos os interstícios que a VIDA te permite.
LINDA, como linda é a tua estrelinha!

No sossego da minha vida, encontrar-vos, foi uma benção divina!

Os nossos ossos estão velhos, sem dúvida. Anda-se mais devagar, olhando sobranceiramente a vida escorrendo por entre os nossos pés, porque já olhamos de cima. Mas olhamos, LIA! E com que olhos!!!

Não te apoquentes com a idade. Deus Nosso Senhor manda as dioptrias para não percebermos o quão enrugadas estamos. Ficamos sempre bonitas!
Manda-nos a falta de memória p'ra não recordarmos chatices. É um alívio!
Manda-nos também uma capacidade enorme de estarmos nas tintas para a maioria das coisas.

Este véu com que Ele nos privilegia será o manto diáfano da poesia?

...estás a ver para que a idade serve?

PARABÉNS, MULHER!!!
Daniel disse…
Os anos contam, é certo. Mas também nos contam coisas da vida. Revelam-nos em cada roda sua horizontes novos. Há um par deles, era eu mais novo, ou menos velho, outro tanto. Mas ainda não te conhecera, Lia. Não me atreverei a dizer que só por ti valeu a pena chegar à idade que tenho, mas fazes parte importante desse alargar de vistas e de afectos que nos vai completando cada vez mais. Até ao dia em que, e lembrando o que disse Sebastião da Gama, a morte nos complete. Oxalá que então alguém possa olhar para um ponto na memória, ou para uma palavra num livro, ou para um saber adquirido, para qualquer parte da sua própria alma, e dizer "Passou Aqui". Mas dizê-lo com gratidão e aquela tristeza meio alegre das saudades boas.
Lia, vive a vida enquanto vais passando. A gente gosta de te ter por cá, e nenhum de nós está decerto interessadoo em contar-te as rugas mas sim em saborerar as marcas que deixas.
Parabéns pelos anos que já viveste. Parabéns, a ti e aos que continuarem a acompanhar-te, pelos muitos que hás-de viver ainda.
("Passou Aqui" é o título da biografia de um pioneiro do Oeste, que li há muitos anos.)
Daniel
Cris disse…
O meu lar ganhou mais uma página em branco .Que como as outras será grafada com pena de ouro,e nanquim na tonalidade das estrelas mais brilhantes.Lia são tão lindas as marcas do tempo,e serás bela sempre,porque és dona de uma beleza rara.E até mesmo a beleza fica madura,como os frutos mais saborosos.A menina vai morar sempre em ti,porque és mulher de sonhos, de vida colorida, vida com aroma e sabor.
Não sabes o quanto de ti mora em cada um de nós,graças a Deus!
Felizes são os que partilham contigo nesta história de Peter Pan.
Seja feliz minha flor.
Delfim Peixoto disse…
Tem uma coisinha no meu canto que começa assim ( O Senhor Professor Fidalgo que não leve a mal)



"Ah quanta beleza passava no corredor
E o sorriso aberto e franco
Parecia levar uma fada
Ou uma Princesa"
Anónimo disse…
"pássaro do Norte,bando de asas doces
trazes melodias para canrar às moças
em dias de alegria, em dias de romaria!"
Um dia especial para um ser especial.Parabéns e que continues com essa alma de pássaro da alma.
BEIJO
Anónimo disse…
Parabéns! Felicidades! Desejo que as palavras poéticas continuem a iluminar o meu monitor.
Beijinhos de amizade
Isabel
Anónimo disse…
Muitos parabéns! Pelo aniversário e pelo que desperta nas pessoas, incluindo, obviamente, os alunos.

Quem lê o texto, apercebe-se da sua grande Alma. Claridade..

"Continuo a gostar de brincadeiras malucas , de sorrisos e de gargalhadas, de partidinhas, de surpresas, do sol infinito e das árvores altas, mesmo se as vejo de baixo, da areia do mar, das crianças( meu Deus, as crianças!!!) , do passado que guardo intacto no meu espaço mais íntimo."

Parece ter a nossa idade. Ah! E que felicidade isso dá! Saber que que é possível atingir a idade adulta com tanto brilho e vivacidade. As memórias são reconfortantes, quando se teve uma vida que nos acalorou. E ainda há tanto para descobrir..

Espero que tenha um dia fantástico. Espreite, mais uma vez, pela janela..o mundo está a sorrir para si :)

Obrigado por tudo
Anónimo disse…
Parabéns,Isabel.
AC disse…
A luz é um alimento essencial à vida. Há seres que se satisfazem em sugar a luz dos outros, quais vampiros em busca de sangue fresco. Outros, pelo contrário, realizam-se irradiando luz à sua volta, e quanta mais luz distribuem mais felizes se sentem. Gosto de pensar que são seres predestinados, cujo código genético foi abençoado por manipulação divina. A Ibel é um desses seres especiais, a cuja luz ninguém fica insensível. Como recompensa - e esta é uma história de vida feliz – foi contemplada com uma família que, só de ver, faz um bem tremendo à alma.
Parabéns, Ibel! E, sabe uma coisa? A sabedoria não está ao alcance de todos. Tenho a certeza que lhe saberá dar um excelente uso.
Anónimo disse…
Parabéns,Isabel.
És uma envelhescente,como nós.Vives a madura idade mas guardas em ti o melhor da adolescência:o sonho e a utopia.
Gostei muito do texto da estrela pequenina.
Abraço
Anónimo disse…
Mais velha? Depende da perspectiva.

Para mim, terá sempre a idade que tinha quando a conheci, nos auspiciosos espaços da Escola D. Maria II. Para mim, será sempre uma mulher deslumbrante fisicamente, afectivamente e intelectualmente. Profissionalmente, é um dos meus "dinossauros" de estimação.

(Sei que, para quem não conhece o contexto, esta metáfora poderá parecer de gosto duvidoso, mas a Isabel conhece bem o seu alcance semântico.)
Elisabete disse…
Amiga,
Texto lindo recheado de afectos e memórias, da sabedoria que a idade, normalmente, traz. O futuro está aí, à tua espera. Sei que vais ainda concretizar muitos sonhos e escrever muitas coisas belas para nosso deleite, nós que temos o privilégio de poder contar com a tua amizade.
O melhor do mundo para ti!
Ibel disse…
A todos um enorme obrigada, aos de perto e aos de longe. É muito bom ter espaços de afectos, mesmo que alguns amigos ainda sejam só virtuais.
Habituei-me a já não passar sem a vossa presença e o meu mundo já não seria o mesmo sem vocês.
Anónimo disse…
Ibel

A minha ideia era escrever no dia, mas não foi possivel!

A Matilde adorou cantar os parabéns à Tia Ibel!
Nós (Eu e a Carla) ficamos felizes por ver a felicidade que lhe transmites com as tuas brincadeiras (apesar de que para mim não é novidade)!
Quem faz assim os outros felizes merece todo o carinho do Mundo!

Eu fico orgulhoso por te poder chamar a "minha Ibel"! Ainda hoje sempre que te dou um beijinho de Ola sinto a ternura que nos tens!

Um Beijinho enorme dos três!!
Mar-ia disse…
Lia
Hoje que é dia de poesia, não há nada, nada, para alegrar as hostes?

A próposito deste texto, vi ontem
o "estranho caso de Benjamim Button". A história situa-se na Europa entre as guerras e apresenta um indivíduo que nasce fisicamente velho e morre bebé e ausente. O físico contraria o mental.
O filme foi candidato a Óscares e a crítica divide-se.
Eu gostei da reflexão. Fez-me lembrar a temática que Saramago cria nas "intermitências da morte".
Unknown disse…
"Só o corpo envelhe; a alma não." kundera

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