Do monte até à fonte | |
Do ventre sagrado dos montes
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da mina de que venha, escorrendo
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por um sulco de terra húmida, molhada ,
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por um chão de pedra rolada, lavada ,
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lágrima constante, não gemendo ,
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arrastando raizes e sementes
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não cuidando de saber quais são as gentes
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a quem mate a sede ou lave as frontes
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Mais abaixo irá depois chegar, pingando
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numa taça de pedra, e vai ficando
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calmamente, aguardando
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que pelo menos uma mão
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gentilmente a vá colhendo ,
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e a sede de boca que houver
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que venha para a sorver
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e a louvar, bebendo.
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Aqui chama-se fonte, pois então,
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numa gruta ou num caramanchão
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com ares que lhe dão de monumento
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sem faltar a pedra da carranca
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com forma de uma deusa ou de uma fera
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e o friso de uma vinha ou de uma hera ,
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mostrando lá pousada a pomba branca
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que recorde uma guerra ou um evento !
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será de tragédia ou de glória
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o nome com que fica para a história
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de amantes e seus amores ou desamores
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na sombra do que foram seus destinos
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ou insignes pensadores e escritores
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em odes deixadas como hinos
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cantos de pena de um poeta eminente
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rendilhando um epitáfio comovente
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onde o sol, o céu, o mar, os ventos
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se envolvem em louvores ou em lamentos.
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ESTIO À BEIRA-FRIO
Sinto no frio da água E no outono da folha O Inverno ch egado. Um certo desalento Um certo desagrado E uma paixão no mesmo assento. Porque será ? É agora o tempo Do crepitar da brasa E do silêncio recolhido No calor do livro. É tempo de carpir E de despir a árvore A folha desbotada. Mas se é lisa a fêmea vegetal Cobre-se de folhagem O chão E a fria paisagem Esquenta a emoção Da miríade miragem. O vento geme nos beirais E dos confins do céu Não há sinais de asas. A chuva é cântaro Mas crepita o lume E a mão espevita Lascivamente o livro. A página levanta a saia Num sorriso de catraia E faz-se estio à beira-frio.
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